Desaceleração das correntes oceânicas pode ter efeito devastador no clima global

Causado pelo aquecimento das temperaturas globais, esse fenômeno pode causar aumento do nível do mar, ondas de calor intensas e fortes furacões

Por Jackson Dill e Brandon Miller, da CNN


Derretimento de calotas polares provocada pelo aquecimento global aumenta o nível dos oceanos Foto: PublicDomainPictures/Pixabay


Você se lembra do filme “O Dia Depois de Amanhã”, em que uma série catastrófica de desastres globais ocorre depois que as mudanças climáticas fazem com que as correntes oceânicas parem?


Bem, novas pesquisas revelam que as principais correntes oceânicas da Terra estão diminuindo e, embora as consequências não sejam tão imediatas ou dramáticas como na ficção de Hollywood, há impactos no mundo real para os padrões climáticos globais e nos níveis do mar.


A desaceleração da circulação oceânica é causada diretamente pelo aquecimento das temperaturas globais e tem sido prevista por cientistas que estudam o clima.

“Isso foi previsto, basicamente, por décadas de que essa circulação enfraqueceria em resposta ao aquecimento global. E agora temos a evidência mais forte de que isso já está acontecendo”, disse Stefan Rahmstorf, da Universidade de Potsdam, na Alemanha. Rahmstorf contribuiu para a pesquisa.


A Circulação de Revolvimento Meridional do Atlântico (AMOC, na sigla em inglês) transporta água através dos oceanos do planeta, incluindo o Atlântico, Pacífico e Índico. A região que contribui para a desaceleração é o Atlântico Norte, segundo a pesquisa.

“A ideia (do filme), que é realmente correta, é que se essa circulação de revolvimento do Atlântico se romper completamente, isso levará a um forte resfriamento em torno do Atlântico Norte, especialmente na Europa, em áreas costeiras como Grã-Bretanha e a Escandinávia. Mas isso só acontece se o revolvimento for interrompido completamente”, disse Rahmstorf.


Nessa parte do oceano, os mantos de gelo da Groenlândia estão derretendo, contribuindo tanto para a elevação do nível do mar quanto servindo para reduzir a velocidade de circulação.


“Isso indica que a desaceleração provavelmente não é uma mudança natural, mas o resultado da influência humana. A AMOC tem uma profunda influência no clima global, e particularmente na América do Norte e na Europa, então esta evidência de um enfraquecimento contínuo da circulação é crítica para a interpretação das projeções futuras do clima regional e global”, disse Andrew Meijers, vice-líder científico dos oceanos polares do British Antarctic Survey.


O derretimento do gelo na Groenlândia e as fortes chuvas no Atlântico Norte induzidas pelas mudanças climáticas afetaram a salinidade e a densidade das águas, explicou Rahmstorf.


Ele disse que “tanto o aquecimento da superfície quanto o aumento do ciclo da água, das chuvas e o derretimento do gelo são consequências do aquecimento global” em partes do Oceano Atlântico Norte.


À medida que as correntes de água quente se movem para o norte, elas normalmente voltam para o sul conforme ficam mais frias e pesadas. O acréscimo de água doce do gelo derretido está fazendo com que essa volta seja mais lenta por causa da salinidade reduzida.


“Esse enfraquecimento também leva ao frio no norte do Atlântico, mas está confinado ao oceano. Essa bolha fria, como a chamamos, está sobre o oceano e não atinge áreas terrestres”, disse Rahmstorf. As estimativas atuais mostram que esse enfraquecimento é moderado, cerca de 15% mais fraco em comparação ao normal e com base em dados analisados de até 1.600 anos atrás.


Costa Leste dos EUA poderá ter o nível do mar mais alto


Um dos principais impactos da desaceleração da circulação do oceano é sobre os níveis do mar, especialmente os da costa leste dos Estados Unidos.


“O fluxo norte da superfície da AMOC leva uma deflexão das massas de água para a direita, longe da costa leste dos Estados Unidos. Isso se deve à rotação da Terra que desvia objetos em movimento, como correntes para a direita no hemisfério norte e para a esquerda no hemisfério Sul. À medida que a corrente desacelera, esse efeito enfraquece e mais água pode se acumular na costa leste do país, levando a um aumento acentuado do nível do mar”, disse Levke Caesar, um dos autores do relatório.

O aumento do nível do mar já está acontecendo devido a fatores como o derretimento das camadas de gelo e o aquecimento dos oceanos. De acordo com a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, na sigla em inglês), os níveis de água aumentaram em média 20 a 23 centímetros nos últimos 140 anos.


O ritmo em que essas águas estão aumentando também subiu nos últimos anos.

“O ritmo do aumento do nível do mar global mais do que dobrou, de 1,4 mm por ano durante a maior parte do século XX, para 3,6 mm por ano de 2006-2015”, disse a NOAA.

Uma desaceleração adicional da circulação oceânica global, especialmente ao longo da crucial corrente do Golfo ao largo da costa leste dos Estados Unidos, poderia se combinar com a já acelerada elevação do nível do mar para tornar as principais cidades do nordeste do país ainda mais vulneráveis a inundações.


Ondas de calor mais quentes, furacões mais fortes


Os padrões climáticos globais estão criticamente ligados às circulações oceânicas e seu transporte de calor e nutrientes ao redor do planeta.


Um aumento nas ondas de calor em toda a Europa e furacões mais fortes perto da costa dos EUA por causa da água mais quente que se aproxima da costa podem estar ligados à circulação do oceano, disse Rahmstorf.


“Os sete anos mais quentes do mundo ocorreram desde 2014, com 10 dos anos mais quentes ocorrendo desde 2005”, disse a NOAA. As ondas de calor já estão se tornando mais frequentes.


O oceano e as correntes também desempenham um papel na absorção de dióxido de carbono da atmosfera, o gás de efeito estufa mais dominante. De acordo com a NASA, as mudanças nas correntes podem diminuir a quantidade de carbono que está sendo retirado da atmosfera.


Além de pessoas serem afetadas, as espécies da biologia marinha também estão em risco.


Os organismos marinhos “dependem fortemente dessas correntes oceânicas, que basicamente estabelecem as condições para todo o ecossistema em termos de fornecimento de nutrientes, temperatura e condições de salinidade”, disse Rahmstorf.

Quando questionado se a AMOC poderia desacelerar ainda mais ou mesmo parar, Rahmstorf disse que os modelos climáticos sugerem que as correntes diminuirão entre 34% e 45% até 2100.


“Apesar de muitas pesquisas na última década sobre isso, é muito difícil determinar quantitativamente a que distância está esse ponto de virada. Mas o tipo de modelo de simulação que conheço sugere que se essa circulação enfraquecer pela metade, entraremos em um estado crítico. E isso pode muito bem acontecer até o final do século”, disse Rahmstorf.


“Devemos (nos esforçar para) ficar bem longe desse ponto de virada, porque as consequências se a circulação quebrasse por completo seriam realmente dramáticas”.

Hollywood nos mostrou potencial pior cenário das mudanças climáticas. E embora as consequências mostradas no filme “O Dia Depois de Amanhã” sejam muito improváveis, elas ilustram como os impactos descontrolados da mudança climática podem resultar se não dermos ouvidos aos avisos vindos dos cientistas que estudam o clima.


(Texto traduzido, clique aqui e leia o original em inglês)

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